terça-feira, 13 de maio de 2014

Páginas de uma carta qualquer (2)

... e minhas costas doem, sabe? Quando o tempo esfria e eu não tenho ânimo pra levantar, começo a sentir essa dor chata e triste, quase como quando você foi embora naquele verão em 89, eu tinha vinte anos e reclamava de tudo e de todos, mesmo sendo você a única coisa perfeita no meu mundo eu reclamava que você não errava, que eu não errava, que nada era errado pra gente, e continuávamos sempre ouvindo aqueles rocks e querendo estar em London, London, ou então batíamos cabeça em todos os shows que íamos. E aí você foi embora, eu me senti caindo caindo caindo, como quem voava a 200 km/h em direção a um copo dágua, não sabia onde era o chão, exatamente...

... só queria te falar que tenho saudade, mas não sei se de você, daquele tempo, da gente ou simplesmente dos sentimentos e sensações que tínhamos. Não sei, nunca quis muito entender aquilo, ficou como uma eterna interrogação na minha cabeça que substituiu todas as outras, e toda a vida passou a fazer sentido menos aquilo, que dificilmente me ocupava, principalmente depois do meu terceiro casamento e do quinto filho...

... mas deixa pra lá, o melhor é você tratar dessa sua cabeça (vi pelo facebook que você anda com dores sempre) e não facilitar, a gente já não tem mais 20 anos, e tudo que é de ruim começa a aparecer, inclusive amigos mortos, e isso não é legal...


... te espero do outro lado,
Paul.

P.S.: Ah, e talvez meu velório seja marcado pra daqui uma semana, por isso estou enviando por sedex.

P.S. 2: Essa foi minha última carta, lembro que você gostava muito quando eu ditava umas cartas aleatórias e sem nexo pra você, quase um Rimbaud pobre, louco, e extremamente pretensioso...

P.S. 3: Comprei um semana passada pro meu filho.

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